sábado, 24 de abril de 2010

Dadu: a Capital Imperial da Dinastia Yuan


Imagem: Pagode Branco (Beihai em Beijing, China)
Fonte: Diogo Farias

Com as comemorações dos 50 anos de Brasília surgiu a idéia de fazer um post sobre o planejamento e a construção de capitais asiáticas e a escolhida foi Dadu, a "Beijing Mongol". O planejamento de centros políticos é até comum na História, mas creio que Brasília foi um caso especial, pelo seu planejamento e pela necessidade de interiorizar o Brasil - idéia que não era nova, pois já era defendida pelo Marquês de Pombal desde o século XVIII. Desta forma não queremos comparar a construção das duas cidades, Beijing, ou melhor, Dadu foi uma cidade planejada, mas não convém estabelecer muitos paralelos com o moderno projeto de Brasília. É até possível verificar algumas semelhanças entre o modelo tradicional chinês - que pouco foi alterado da Antiguidade até o fim do período Imperial - com o modelo das antigas cidades romanas. Ambos partiam de uma planta retangular com duas avenidas principais, é claro que com uma análise mais detalhada muitas diferênças são reconhecidas - as cidades romanas utilizavam tijolos e pedras na construção dos edifícios públicos, enquanto na China a madeira era a base da arquitetura tradicional, por exemplo. É importante ter cuidado nas comparações entre o Ocidente e o Oriente, pois os conceitos "ocidentais" dificilmente se aplicam à Ásia.

Por que Dadu foi escolhida como tema deste post? Existiram outras cidades na região de Beijing que foram anteriores à Dadu mas, como veremos, a cidade mongol foi a primeira a ser capital de um Império que dominou toda a China; o centro de Dadu foi construído no mesmo, ou muito próximo, do local onde posteriormente foi edificado o centro da Beijing Ming-Qing. A primeira menção à Beijing aparece nas Crônicas da Dinastia Zhou, no século XI d.C., Sima Qian (145 ou 135-86 a.C.) citou Jicheng, localizada à sudoeste da moderna Beijing, nos atuais distritos de Xuanwu e de Fengtai. Durante o primeiro milênio da História Imperial da China, Beijing foi um centro provincial periférico do Norte da China.

Imagem: Khubilai Khan
Fonte: www.h-net.org

Tendo conquistado o Norte da China (Império Jin), o neto de Ghinggis Khan , Khubilai Kahn (Hubilie, 1215-1294), decidiu transferir o seu governo de Karakorum, em 1256, para uma localização mais estratégica em relação à China. Khubilai Khan escolheu um sítio à 200 km de Beijing, Shangdu - chamada por Coleridge e Marco Polo de Xanadu. Em 1263, Khubilai Khan planejava mudar-se para China própriamente dita, foi a partir daí que Dadu dividiu com Shangdu a honra de ser a capital imperial dos mongóis: durante o inverno o Khan ficava em Dadu, mas no verão mudava-se para Shangdu.

Imagem: Khubilai Khan (sentado no cavalo preto e vestido de branco) durante uma caçada. Pintado por Liu Guandao, um famoso pintor da corte Yuan, em 1280
Fonte: www.npm.gov.tw


Depois da queda dos mongóis, o primeiro imperador Ming, Hongwu, alterou o nome de Dadu para Beiping (Norte Pacífico ou Paz do Norte) e posteriormente seu filho mudou o nome para Beijing (Capital do Norte), em 1402.

Imagem: Pagode Branco (Beihai em Beijing, China)
Fonte: Diogo Farias

Khubilai Khan queria ser realmente um Imperador chinês e declarou que Dadu seria o centro burocrático de seu Império, por apenas uma breve interrupção, durante o século XIV, esta cidade permaneceu como centro do Império Chinês até fim da Dinastia Qing. A "Beijing de Khubilai Khan" era uma cidade protegida por muralhas duplas - a muralha exterior, construída entre 1267 e 1268, tinha cerca de 30 km, era retangular e possuia cerca de 11 portões: dois ao norte e três em cada um dos lados restantes. Como na Chang'an dos Tang, havia duas avenidas principais no sentido: norte-sul e leste-oeste. Estas duas avenidas atravessavam a cidade, apenas ao sul a avenida norte-sul era interrompida pela muralha interior da cidade imperial, com objetivo de preservar a privacidade família imperial. Os oficiais só poderiam entrar por seus portões durante o dia e deveriam morar nas 54 subdivisões da cidade-exterior. Uma característica incomum da cidade imperial foi sua divisão em duas seções (Ocidental e Oriental), através de caminhos artificiais de água, que sobreviveram até hoje em Beijing, à oeste da Cidade Proibida, existem ainda os três lagos interconectados. As atuais construções nas ilhas e nas margens destes lagos em sua maioria datam da Dinastia Qing. A Montanha do Pagode Branco, no meio do Beihai, é identificado com Khubilai Khan, de acordo com Marco polo, mas o pagode é do século XVII. Mesmo sua mãe sendo cristã nestoriana, Khubilai Khan tornou-se budista e foi muito influenciado por conselheiros tibetanos. O palácio Imperial, que ficava no local onde hoje encontra-se a Cidade Proibida, foi construido por Khubilai Khan e estava dividido em três seguimentos: um para as audiências imperiais, outro para o culto do Khan e o último er destinado aos aposentos privados da família imperial. O planejamento da cidade foi realizado por Liu Bingzhong, um profundo conhecedor do Confucionismo, por cerca de 30 anos, este mandarim foi conselheiro de Khubilai Khan. O conhecimento de Liu Bingzhong sobre o Daoísmo permitiu, através da geomância, escolher a melhor localização para a nova capital e o lugar cosmologicamente correto das suas principais construções.

Imagem: Beihai (Beijing, China), cheio de colinas artificiais, pavilhões e templos, foi associado à Khubilai Khan que lhe deu uma nova disposição durante a dinastia mongol Yuan.
Fonte: Diogo Farias

A capital de Khubilai Khan não foi a primeira cidade imperial construída em Beijing. Os Qidan e os Jin construiram capitais, de onde governaram o Norte da China e outras regiões. Situada à sudoeste da cidade de Khubilai Khan, a cidade Jin, chamada de Yanjing, foi construída no mesmo local da antiga capital Qidan do Reino de Liao. As lendas sobre a origem do palácio de Khubilai Khan começou com uma montanha sagrada. Por causa dos poderes mágicos desta montanha, os imperadores Jin mudaram da estepe para Beijing, circunstâncias que parecem ter levado à inclusão da montanha no palácio de Khubilai Khan. A lenda conta:

"Os especialistas em geomância diziam que a montanha possuía uma espécie de força-vital para os governantes, que era perigosa para o Império Jin, por que ela estava situada dentro do território mongol. Os Jin e os mongóis eram inimigos, mas os mongóis nunca foram contra a retirada da montanha, aliás eles até ridicularizavam esta idéia. Os Jin ordenaram seus soldados cavar e retirar a montanha. Em Beijing, a montanha se tornou uma colina, no meio do maior lago, feito para circundá-la. Flores e árvores foram plantadas e pavilhões construídos para o desfruto da família imperial. Não muito depois a Dinastia Jin caiu e Khubilai Khan mudou sua capital para Beijing e quando foram levantadas suas muralhas, os mongóis anexaram este lago auspicioso."

Imagem: Dadu, a "Beijing Mongol"
Fonte: COTTERELL, Arthur, The Imperial Capitals of China (Londres: Pimlico, 2007).


Os registros Jin evidenciam que os pavilhões mencionados eram um palácio de campo, uma residência imperial fora das muralhas de Yanjing, que foi destruído quando os mongóis conquistaram a cidade. Alguns terraços de terra batida onde o palácio Jin foi construído, poderiam ter sido poupados. Se isto ocorreu, seu reaproveitamento por Khubilai Khan pode explicar a escolha do local onde foi construído o palácio imperial. Não apenas pela agradável montanha e seu lago, mas também porque os mongóis economizariam uma imenso trabalho se não precisassem aterrar esta imensa área. Quando as associações mágicas com o local foram levadas em conta, fica claro entender porque Khubilai Khan passava boa parte do ano em Beijing. Os mongóis poderiam armar suas tendas ao lado do lago e viver à maneira mongol até que o palácio estivesse pronto.

Imagem: As várias capitais em Beijing: Qidan, Jin, Mongol e Ming-Qing
Fonte: COTTERELL, Arthur, The Imperial Capitals of China (Londres: Pimlico, 2007).


O palácio de Khubilai Khan foi construido em estilo imperial chinês, quando os Ming transferiram sua capital para Beijing, os imperadores desta dinastia nativa mantiveram o estilo da cidade de Khubilai Khan, muitas das construções Ming eram réplicas muito próximas da "Beijing Mongol".

Imagem: Yongan Si (Beihai em Beijing, China)
Fonte: Diogo Farias

A exata localização da Colina Verde é ainda discutida. É possível que a Montanha do Pagode Branco, descrita por Marco Polo, pode ser real. Se não for verdade, a Colina Verde estaria localizada muito próxima do lago e ao norte do palácio. Neste caso, pode ter ocorrido uma alteração durante a construção da Beinjing Ming, quando as cinco colinas foram feitas, utilizando a terra do fosso (canal) que protege a Cidade Proibida.

Em breve escreveremos posts sobre a Beijing Ming e Qing, também seria interessante trabalhar com a História da construções de outras capitais asiáticas. Para semana que vem será feito o já prometido post sobre a crise política na Tailândia.

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