Imagem: um soldado tailandês faz guarda no templo Ta Moan.
Fonte: khmerization.blogspot.com (Tawatchai Kemgumnerd).
O conflito ao longo da fronteira entre o Camboja e a Tailândia continua depois que dois acordos de cessar-fogo foram desrespeitados em 22 de abril, desde então cerca de 17 pessoas foram mortas. A disputa gira em torno do domínio de uma área próxima às ruínas de antigos templos hindus. Cerca de 50 mil pessoas dos dois lados da fronteira fugiram para abrigos temporários, enquanto tropas tailandesas e cambojanas continuam patrulhando a região. Não se espera que estas escaramuças conduzam a um conflito em larga escala, mas a disputa já fechou o comércio entre fronteiras e causou nervosismo entre as populações dos dois países.
Imagem: Tailândia e Camboja disputam o domínio sobre o templo do século XIII Ta Muen Thom, que se localiza na fronteira entre os dois países. Este conflito fez o Departamento de Artes da Tailandês abandonar o sítio em 2001.
Fonte: khmerization.blogspot.com
Os militares tailandeses afirmam que sua luta tem o objetivo de impedir a tentativa do Camboja em dominar as ruínas dos templos Ta Krabey e Ta Moan. Ainda segundo eles, o Camboja quer expandir seu controle sobre a área após as conquistas de 1962, quando a Corte Internacional de Justiça em Haia concedeu ao país o domínio sobre as ruínas de Preah Vihear, a cerca de 200 quilômetros a leste do local dos conflitos atuais.
Ambos os lados trocaram acusações de agressão tornando quase impossível saber quem atirou primeiro. Em fevereiro, quatro dias de conflitos perto de Preah Vihear matou um total de dez soldados antes das hostilidades cessarem. O Secretário Geral da ONU Ban Ki-moon e a ASEAN - da qual o Camboja e a Tailândia são membros - pediram para os dois países negociarem um cessar-fogo, mas seus líderes utilizam o conflito para cultivar um sentimento nacionalista entre a sua população e solidificar suas bases de poder. O Camboja pretende internacionalizar o problema e pedir para a ONU e a Indonésia intermediarem o conflito, em contrapartida, a Tailândia prefere uma negociação bilateral.
Durante este fim de semana, os cambojanos afirmaram que tropas tailandesas lançaram projéteis de 75mm e 105mm "carregados com gáses venenosos", mas não há evidências do ocorrido e Bangkok nega esta alegação. Em fevereiro, a Tailândia negou ter lançado bombas de fragmentação contra o Camboja, mas posteriormente admitiu o seu uso. Em compensação, a Tailândia acusa o Camboja de utilizar civis como escudos humanos em áreas militarizadas. Os EUA mantêm boas relações com os dois países e não veem necessidade de intervirem no conflito.
A Tailândia sentiu-se provocada pelo plano cambojano de explorar o potencial turístico das ruínas de Preah Vihear, um templo hindu do século XI. Em 2008, este templo foi declarado pela UNESCO como Patrimônio da Humanidade. Através de seu novo status Preah Vihear pode se tornar uma atração turística economicamente valiosa para o Camboja, mas para explorar esse potencial há a necessidade de reformar o caminho até a falésia onde se situa o templo. O problema é que esta estrada atravessa o território disputado pelos dois países.
Imagem: Área contestada pela Tailândia
Fonte: www.preah-vihear.com
O conflito coincide com o temor da imprensa e dos políticos de oposição tailandeses de que os militares do país estajam preparando um putsch para instalar um novo regime fantoche. Estes militares receiam um possível retorno do antigo primeiro-ministro Thaksin Shinawatra, que foi retirado do cargo num sangrento golpe em 2006. Thaksin está exilado em Dubai para escapar de uma sentença de dois anos de prisão por corrupção durante sua administração. Após a queda de Thaksin, o primeiro-ministro cambojano Hun Sen o apontou como seu conselheiro econômico especial, cargo que foi recusado posteriormente.
Imagem: soldados cambojanos caminham durante patrulha (Preah Vihear, 2008).
Fonte: ki-media.blogspot.com
Um ano atrás, cerca de dez mil "camisas vermelhas", membros da Frente Nacional Unida da Democracia contra a Ditadura (UDD), realizaram uma insurreição que durou nove semanas em Bangkok, eles protestaram pela realização de eleições livres com o objetivo de trazer de volta Thaksin ao poder. Segundo a organização, o governo de Abhisit Vejjajiva tomou o poder de forma "ilegítima", apoiado pelo exército e pelo poder judiciário. Os camisas vermelhas foram brutalmente reprimidos pelo exército, num conflito que vitimaram 91 pessoas, a maioria delas civis. Muitos líderes camisas vermelhas fugiram para o Camboja.
Desde a criação da Monarquia Constitucional em 1932, a Tailândia enfrenta um longo ciclo de golpes realizados por seus militares e chegou a ter neste período 16 constituições, sendo que a atual está em vigor desde 2007 e é alvo de crítica dos camisas vermelhas.
Desde a criação da Monarquia Constitucional em 1932, a Tailândia enfrenta um longo ciclo de golpes realizados por seus militares e chegou a ter neste período 16 constituições, sendo que a atual está em vigor desde 2007 e é alvo de crítica dos camisas vermelhas.
Abhisit, que assumiu o cargo de primeiro-ministro em dezembro de 2008, desfruta de um forte apoio militar e seu governo realizou uma renovação dos equipamentos militares ao comprar uma dúzia de aeronaves suecas Gripen, seis submarinos usados alemães e diversos blindados ucranianos. Em 2009, de acordo com o Stockholm International Peace Institute, os gastos militares tailandeses chegaram a 2,9 bilhões de dólares enquanto o Camboja gastou “apenas” 191 milhões de dólares. Abhisit afirmou que pretende realizar eleições nacionais em junho ou julho deste ano, mas muitos analistas desconfiam que os militares não queiram realizá-las, devido à preocupação de que um governo pró-Thaksin possa assumir o poder. A oposição tailandesa já afirma que se vencerem as eleições irão fazer um acordo com o Camboja, destino de muitos exilados políticos tailandeses.
A Tailândia sempre exerceu uma pressão histórica sobre o Camboja, sendo que entre os séculos XVIII e XIX muitos monarcas cambojanos eram vassalos dos reis do Sião (antigo nome da Tailândia). O conflito territorial agravou-se com o domínio colonial francês sobre o Camboja. Estas antigas rivalidades inflamam ainda mais a tensão na fronteira dos dois países. A situação instável continua sem um debate decisivo sobre a sua resolução e ainda podem ocorrer novos conflitos. O contexto político interno tailandês tornou o caso ainda mais importante para o orgulho dos militares do país e da legitimidade do regime atual, dificultando a realização de um acordo.
Do lado cambojano, Hun Sen utiliza o nacionalismo para promover seu regime e aproveita a situação para explorar um vizinho que enfrenta diversas facções políticas. Hun Sen vê neste conflito uma chance de marginalizar seus opositores. Em 2008, quando Preah Vihear tornou-se Patrimônio da Humanidade, a decisão foi festejada com um concerto gratuito no Estádio Olímpico de Phnom Penh. Com o sentimento nacionalista revigorado, o Partido Popular Cambojano (PPC) conseguiu 90 das 123 cadeiras da Assembléia Nacional, nas eleições de 2008. Além de explorar o orgulho patriota para vencer as eleições, Hun Sen utiliza o conflito para fazer com que seu filho Hun Manet seja seu sucessor como próximo primeiro-ministro do país.
Do lado cambojano, Hun Sen utiliza o nacionalismo para promover seu regime e aproveita a situação para explorar um vizinho que enfrenta diversas facções políticas. Hun Sen vê neste conflito uma chance de marginalizar seus opositores. Em 2008, quando Preah Vihear tornou-se Patrimônio da Humanidade, a decisão foi festejada com um concerto gratuito no Estádio Olímpico de Phnom Penh. Com o sentimento nacionalista revigorado, o Partido Popular Cambojano (PPC) conseguiu 90 das 123 cadeiras da Assembléia Nacional, nas eleições de 2008. Além de explorar o orgulho patriota para vencer as eleições, Hun Sen utiliza o conflito para fazer com que seu filho Hun Manet seja seu sucessor como próximo primeiro-ministro do país.
Hun Manet se formou em 1999 na Academia Militar de West Point e ocupa a posição de vice-comandante das Forças Armadas Reais e de diretor do Ministério da Defesa, onde controla um departamento de contra-terrorismo sustentado pelos EUA. A carreira de seu pai, que fora comandante de um regimento do Khmer Vermelho na década de 1970, demonstra que a experiência militar pode contribuir em sua escalada ao poder.
O conflito com a Tailândia ajuda a mascarar os conflitos internos cambojanos, como acusações de corrupção contra alguns membros do governo e as incursões realizadas pelos vietnamitas na fronteira oeste do país. Atualmente, a oposição está fragmentada e poucos duvidam que o PPC vencerá as eleições para os conselhos comunais no ano que vem. Neste contexto, o conflito passou a representar mais o debate entre as dinâmicas internas de cada país do que uma escalada para uma guerra em grande escala entre os dois Estados, porém esta possibilidade não pode ser totalmente descartada.
Imagem: Preah Vihear
Fonte:www.doismb.com.br
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